Data de publicação: 28-02-2020 15:24:00

Mas obrigado por pensar em mim

Centro de Integração Empresa Escola de Minas Gerais -  CIEE
Foto: Internet/Reprodução
 
Rui Miguel*
 
“Para quê preocuparmo-nos com a morte? A vida tem tantos problemas que temos de resolver primeiro.”
Confúcio
 
Uma de minhas amigas teve um problema grave de saúde e terá que fazer uma cirurgia muito arriscada, além de alguns outros procedimentos. Segundo os médicos, a chance de ela sair viva da mesa de operação é de 1 em 3.
 
Essa foi a maneira com que recebi a notícia diretamente dela. No início, assim como todo mundo, fiquei pensativo, murmurei. Eu olhava para ela e ficava imaginando como seria se ela realmente não voltasse. Ela está agora na minha frente, andando igual a uma gazela desvairada, e amanhã ela pode ser enterrada e eu estar chorando por ela.
 
Voltamos àquela velha frase clichê: nós não valemos nada. Tudo pode acontecer em milésimos de segundos e podemos perder tudo de uma hora para outra.
 
Mas, depois de algum tempo vendo e observando essa minha amiga explicando os trâmites da cirurgia, a complexidade, os riscos e outros fatores, e observando a sua face serena – mas que trazia junto uma tristeza por saber que tudo poderia acontecer, e isso é indisfarçável –, eu interrompi a conversa dela com as outras pessoas e perguntei diretamente:
 
– Seguinte: você veio aqui me dar essa notícia. Eu fico agradecido pela sensibilidade em pensar em mim enquanto está passando por tantas coisas e ainda ter tempo e vontade comungada com amor para me avisar, mas me responda uma coisa: como você quer que eu te trate depois de saber de tudo isso, com vitimismo e piedade, passando a mão na sua cabeça, falando que vai dar tudo certo, mesmo sabendo que a estatística não está muito a seu favor, ou vamos rir dessa merda toda enquanto podemos?
 
Nesse momento, ela olhou para mim e disse:
 
– Faça o que quiser, mas não deixe de ser você.
 
Nesse mesmo instante, eu me afastei dela, fui até o quarto e peguei minha bolsa de coisas particulares, que possui senha e cadeado. Abri-a lentamente. Peguei uma carta que outrora eu escrevera e, ao chegar perto da minha amiga, olhei bem nos olhos dela, quase lacrimejando e disse:
 
– Se você subir, você entrega essa carta para Jesus?
 
Caímos na risada a tarde inteira e foi que valeu o dia.
 
Quando é que temos que levar a morte a sério? Ela faz parte da vida e é de nossa inteira responsabilidade resguardá-la. Se a morte é inevitável, de que adianta eu agonizar enquanto ela não chega? Se ela é iminente, não vamos viver como quem quer adiá-la, e, sim, aumentar a nossa vida.
 
Adianta você gritar? De que adianta pedir socorro? Não tem nenhum objetivo. Você não vai sair vivo dessa. Aceite.
 
Mas temos que entender que a melancolia e a tristeza não podem ser eternas, porque você não tem como reverter a situação. Então, aceite a morte, pois nada do que você fizer vai mudá-la e o mundo não para de girar enquanto você tenta se recuperar.
 
Por isso que rir de si mesmo, de seus problemas e até da morte é uma questão de saber dar valor à vida. Pessoas que ficam enclausuradas em problemas mesquinhos e ínfimos que levam a lugar nenhum apenas perdem tempo. Todos nós sofremos por algo ou alguém, mas o que eu quero enfatizar é que temos que sofrer por coisas que valham a pena e não por aquilo que é irrisório e imutável.
 
O que faz você valorizar a sua vida? O que faz você querer aproveitar cada segundo, cada instante, cada momento? O que faz você querer trabalhar para juntar dinheiro e, enfim, aproveitar da vida? O que faz você querer conhecer novos lugares, novos amores e novas experiências? Não é o fato de que a vida seja estúpida e que você pode perder essa oportunidade de um dia para o outro? Não é saber que o seu tempo é finito e que essa finitude, por mais grotesca que seja, não lhe dê ao mínimo uma chance de saber quando acontecerá?
 
Você tem que viver a vida da maneira que acreditar que te fará feliz, seja viajando, trabalhando no que gosta ou ficando em casa com a sua família.
 
O valor que as pessoas dão para cada particularidade da vida é estritamente pessoal e cada valor é agregado por nós. Dessa maneira, cada um sabe o que o deixa feliz.
 
Você se acha feliz? Neste exato momento em que está lendo este texto, você está feliz? Melhor ainda: você é feliz? Se não for ou se não estiver, você sabe o que te traz felicidade?
 
No fim de tudo, quando você olhar para trás, vai ter valido a pena? Se você acha que não, então, o tempo de mudança é o AGORA.
 
--
 
*Rui Miguel cresceu em Contagem. É formado em engenharia de rede de computadores e especialista Microsoft. Tímido e paradoxalmente extrovertido. Misterioso e intrigante, mas com um senso de humor incrivelmente inteligente e sarcástico. Em 2007, teve os primeiros sintomas do Parkinson e, depois de seis meses, o diagnóstico foi confirmado. É autor do livro “Entrando no parkinson de diversões” e, em 2017, foi nomeado comendador e profissional do ano com o blog que fala sobre “como viver a vida e não apenas sobreviver” (www.ruimiguel.com.br). Também possui um canal no YouTube onde trata do mesmo assunto.
 
(O conteúdo dos artigos publicados pelo Diário de Contagem é de responsabilidade dos respectivos autores e não expressa a opinião do jornal.)
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