Foto: Google Street View/Reprodução
AGÊNCIA BRASIL
A remoção de 34 moradores de uma área próxima à barragem Norte/Laranjeiras, em Minas Gerais, será planejada e levará em conta a pandemia de Covid-19. A afirmação é do coordenador-adjunto da Defesa Civil estadual, tenente-coronel Flávio Godinho. A estimativa é que a evacuação, anunciada nesta quarta-feira (18) pela mineradora Vale, tenha início na próxima semana.
A barragem Norte/Laranjeiras integra a Mina de Brucutu, localizada em São Gonçalo do Rio Abaixo, na região Central. A mina é considerada a maior da Vale no Estado. A área que seria atingida no caso de um rompimento e que precisará ser evacuada, no entanto, está na cidade vizinha: Barão de Cocais.
De acordo com a Vale, a evacuação é preventiva e a estrutura não vinha recebendo novos rejeitos de mineração, estando fora do plano de produção desde 2019. A mineradora elevou a barragem para o nível de emergência 2, conforme a classificação estabelecida pela Agência Nacional de Mineração (ANM). A escala vai até 3, quando o risco de rompimento passa a ser considerado iminente.
“Como a barragem está em nível 2, faremos a evacuação planejada. Isso significa que haverá tempo para que as famílias possam escolher as residências onde serão alocadas. A princípio, ninguém será levado para hotel. Em função da Covid-19, a opção prioritária é que as famílias sejam desde já realocadas em casas que elas escolherem. Após a escolha, a Vale deverá fazer alguma reforma que esses imóveis necessitarem. Na sexta-feira, a Defesa Civil de Minas Gerais irá tratar de todas as ações em Barão de Cocais”, disse o tenente-coronel Godinho.
Todos os alugueis serão obrigatoriamente custeados pela Vale. A remoção das primeiras famílias, segundo o coordenador-adjunto da Defesa Civil, deverão ocorrer a partir de segunda-feira. Como esses moradores também desenvolvem atividades agropecuárias, um total de 790 animais precisará ser levado para outros locais.
Godinho afirmou ainda que a situação decorre de uma trinca em uma ombreira da barragem. Segundo a Vale, a elevação do nível de emergência foi decidida com base em uma abordagem conservadora da empresa, já que não teriam sido observadas alterações relevantes.
Histórico de remoções
Essa não será a primeira evacuação realizada em Barão de Cocais, onde há uma das quatros estruturas da Vale que estão atualmente no nível 3 de risco de rompimento. Trata-se da barragem Sul-Superior, da Mina de Gongo Soco. Na cidade, quase 500 pessoas estão foram de suas casas.
A situação é um desdobramento das duas tragédias ocorridas no Estado nos últimos anos. Em novembro de 2015, uma enorme devastação na bacia do Rio Doce e a morte de 19 pessoas foram consequência do rompimento de uma estrutura mantida pela Samarco, uma joint-venture da Vale e da BHP Billiton, em Mariana, também na região Central. Já em janeiro de 2019, outra barragem se rompeu em Brumadinho, na Grande BH, deixando 270 mortos. A responsável pela estrutura era a mineradora Vale.
Após a segunda tragédia, um pente-fino nas estruturas de mineração foi realizado, envolvendo desde vistorias da ANM até ações judiciais movidas pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) para pedir a paralisação das atividades em determinadas minas. Como resultado, dezenas de barragens foram consideradas inseguras e ficaram impedidas de operar. Nos casos considerados mais críticos, a Justiça ou a ANM exigiu a retirada da população das áreas de risco.
Além disso, o poder público determinou que todas as barragens que usam o método de alteamento à montante, assim como as que se romperam em Mariana e em Brumadinho, deveriam ser paralisadas e descaracterizadas. Atualmente, a Vale possui mais de 30 estruturas paralisadas e com algum nível de emergência acionado. Segundo as normas vigentes, quando a situação da barragem exige a elevação do nível de emergência para 2 ou 3, é obrigatória a retirada de famílias da zona de autossalvamento, isto é, da área que seria alagada em menos de 30 minutos em caso de rompimento.
Muros e intervenção
Diante da situação, a Vale decidiu erguer enormes muralhas de pedra e concreto, algumas com mais de 30 metros de altura. Elas devem funcionar como uma barreira para os rejeitos, caso ocorra um rompimento de barragem, impedindo que a lama alcance as comunidades. Essa estratégia foi adotada com o objetivo de proteger as populações de Barão de Cocais, Santa Bárbara, São Gonçalo do Rio Abaixo e Ouro Preto, além do distrito de Macacos, pertencente a Nova Lima.
Com tantas evacuações, o Ministério Público Federal (MPF) pediu, em setembro, que a Justiça nomeasse um interventor capaz de reestruturar a governança na mineradora e de estabelecer metodologias que seguem padrões internacionalmente reconhecidos para prevenir desastres. “Ao contrário do que afirma publicamente e dos dados que divulga, a Vale desenvolveu ao longo do tempo uma cultura interna de menosprezo aos riscos ambientais e humanos, na qual se apropria dos lucros das suas operações, mas repassa para a sociedade os riscos e os efeitos deletérios da sua gestão”, registra o pedido judicial que ainda aguarda apreciação.
A Vale não é a única mineradora que precisou arcar com o processo de remoção de famílias. A ArcelorMittal, por exemplo, é responsável pela barragem do complexo minerário Serra Azul, situada em Itatiaiuçu, na região metropolitana. Mais de 200 moradores precisaram deixar suas casas após o nível de emergência 2 ser acionado em fevereiro de 2019. Em acordo assinado no mês passado entre a mineradora e o MPF, foi estabelecido um cronograma para a descaracterização da barragem. Ficou acertada também a instalação de um muro de contenção até setembro de 2021 para minimizar os impactos de um eventual rompimento.