Foto: João Bittar
Luciani Dalmaschio¹
Não gosto de ler. Não sei ler. Não consigo entender o que esse texto diz.
Essas são algumas frases que, normalmente, são ouvidas por professores e outros profissionais que trabalham com a formação leitora de crianças, jovens e adultos.
Diante de tais afirmações costumo me perguntar: em que momento se vai insinuando, nessas pessoas, o desgosto pela leitura? E uso a palavra “desgosto” porque, para mim, além de um não gostar - de um (des)gosto -, há também um profundo sofrimento demonstrado diante do ato de ler.
Penso que muitos fatores influenciam para que isso aconteça, mas um deles parece mais interessante de ser discutido: a forma como o texto é apresentado ao leitor. Explico melhor. A leitura é algo muito complexo, não pode apenas ser considerada como uma mera interpretação das letras do alfabeto. Não se trata simplesmente de um processo de decodificação. Afinal, o que está em cena não são apenas palavras que precisam ser decifradas. Ler não pressupõe, portanto, um jogo de adivinhação em que o leitor quase sempre perde por não ser capaz de acertar o que o autor “quis dizer”.
O ato de ler deve ser entendido, antes, como uma relação interativa, que envolve a produção de sentidos estabelecida entre autor/texto/leitor. Ou seja, ao lermos um texto, é preciso que se estabeleça um diálogo entre autor e leitor, de modo que a produção de sentido seja marcada pela ação conjunta desses sujeitos histórico-sociais. Essa postura faz com que o leitor se perceba participante efetivo desse processo; instiga o exercício de sua competência intelectual e possibilita que ele utilize o ato de ler como um instrumento, por meio do qual manifesta seu discurso.
O texto é, por essa via, uma âncora que sustenta não só o mesmo, o igual, mas que permite reformular significados e atualizar ideias. O sentido produzido por ocasião da leitura transforma-se, assim, num valioso instrumento de percepção variada sobre o homem e sua cultura, sobre o sujeito e o mundo que o cerca.
Ler, nessa perspectiva, deixa de ser um exercício penoso de reconhecimento passivo do outro e se transforma em uma atividade ativa de produção de conhecimento que revela de forma simbólica e profunda a realidade humana.
¹ Doutora em Linguística – UFMG
Professora da Nova Faculdade - Contagem