Data de publicação: 25-09-2013 00:00:00

Uma nova velha história

Jornal Diário de Contagem On-Line

Foto: Divulgação

¹Luciani Dalmaschio
²Isamara Grazielle Martins Coura

Comecemos nossas discussões sobre o Acordo Ortográfico tomando por base o parágrafo inicial do documento assinado pelos membros da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP). Assim justificam a adesão às mudanças: “Considerando que o projeto de texto de ortografia unificada de língua portuguesa aprovado em Lisboa, em 12 de Outubro de 1990, pela Academia de Ciências de Lisboa, Academia Brasileira de Letras e delegações de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe, com a adesão da delegação de observadores da Galiza, constitui um passo importante para a defesa da unidade essencial da língua portuguesa e para o seu prestígio internacional [...] acordam no seguinte:...” 

Desse trecho em diante são dispostas as bases de mudança que desde a década de 90, do século passado, discutem a supressão de acentos gráficos, a extinção do trema, a retomada das letras K, W e Y e a reformulação do uso do hífen em nosso idioma oficial.

Nossa pouca simpatia a essa ação se encontra justamente nos dois aspectos que ressaltamos na justificativa dos “idealizadores” do novo Acordo: “...para a defesa da unidade essencial da língua portuguesa” e “para seu prestígio internacional”.

Trabalhamos com a perspectiva de que é inocente postular a unidade de uma ciência, no que se refere a aprisioná-la em regras imutáveis, fechadas e, o pior, que variam não pela interferência viva de seus participantes, mas por um decreto governamental. A menos que não percebamos a Língua como um aparato científico que é aberto, por essência, a novas possibilidades de se constituir, parece-nos equivocada essa tentativa de unificação.

Os defensores do Acordo dizem que não existir uma ortografia oficial que ocasiona dificuldades de caráter linguístico e também de natureza política. Para nós, as dificuldades que se instalam politicamente entre os países lusófonos (que falam a língua portuguesa), principalmente entre Brasil e Portugal ultrapassam um discurso ortograficamente unificado e ganham contornos muito mais amplos que uma simples isonomia de escrita não daria conta de resolver.

E o que dizer sobre o Acordo Ortográfico trazer “prestígio internacional para a língua portuguesa”? Será que essa é realmente a principal necessidade dos falantes lusófonos? Trata-se essa de uma política pública capaz de dar respostas às necessidades desses povos? Sem nem incluirmos na lista Brasil e Portugal, que mesmo muito aquém do ideal ainda se encontram em posição confortável na questão da utilização da língua, achamos mesmo que Angola, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e o mais novo participante da CPLP, Timor Leste, países cujos índices de analfabetismo ultrapassam o índice de 50% da população, ganharão prestígio internacional porque agora falarão uma língua unificada ortograficamente pela comunidade de falantes da qual participam? Na nossa concepção a ideia está torta e invertida. Uma língua ganha em valor internacional depois de, comprovadamente, ser utilizada de forma expressiva por seus usuários, que em função dela serão capazes de manifestarem sua posição social. Ou seja, é preciso ter o que o dizer e dizer bem o que se tem a dizer para que o prestígio social chegue.

A língua é a representação de um estado de coisas e, em contrapartida, esse estado de coisas, amplia a língua. Trata-se, assim, de um jogo de construção social que pode até tentar ser alterado por uma ação política, mas que dificilmente trará algum benefício real à sociedade que, compulsoriamente, vê-se envolvida nesse processo.

O documento ao qual nos referimos no início desse texto, assim determinava no seu artigo 3º: “O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa entrará em vigor em 1 de janeiro de 1994...” Não entrou. Ouvimos em seguida que tinha sido postergado para 1 de janeiro de 2013. De novo não funcionou. Agora uma nova data surge: 1 de janeiro de 2016. Quiçá, novamente, uma impossibilidade seja instalada.

¹ Doutora em Linguística – UFMG / Professora da Nova Faculdade
² Mestre em Educação – UFMG / Professora da Nova Faculdade

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