Data de publicação: 19-11-2019 15:00:00 - Última alteração: 18-11-2019 18:22:14

"Para saber falar, é preciso saber escutar"

Centro de Integração Empresa Escola de Minas Gerais -  CIEE
Foto: Internet/Reprodução
 
Rui Miguel*
 
Quando tenho oportunidade, gosto de conversar com as pessoas que eu não conheço - na rua, em filas, em restaurantes - e gosto de ouvir suas histórias. Normalmente, sem nenhum receio, pergunto: qual é a sua motivação? O que te faz acordar todos os dias e levantar da cama? É uma pergunta para se fazer a quem você mal conhece? Não. Mas, mesmo assim, eu faço.
 
Um belo exemplo disso foi quando minha documentação de motorista venceu. Então, tive que realizar o exame médico novamente para renovar a carteira. Devido a alguns problemas de vista, fui encaminhado para uma segunda consulta de revisão. Ao chegar ao local, estava na sala esperando pelo atendimento e notei que havia outras pessoas na fila. Fiquei curioso para saber por que estavam ali, pois, de alguma maneira, também tinham sido reprovadas no primeiro exame médico. Primeiro, reparei em uma senhora que estava com vários documentos na mão e impaciente, balbuciando algum tipo de reclamação.
 
Logo perguntei para ela por que ela estava ali e tive a seguinte resposta:
 
— Eu estou aqui para provar que tenho braço.
 
— O quê?! — exclamei.
 
— No meu último exame médico, o aparelho disse que eu não tenho o braço esquerdo.

E eu novamente perguntei:
 
— O quê?!
 
— Sim. Eu não consegui tirar a carteira, pois o laudo médico disse que eu não tenho braço.
 
Sem nenhum remorso, eu iniciei uma risada que contagiou a todos na sala. Fiquei imaginando a senhora caindo em uma blitz e tendo que explicar para o policial que ela tinha um braço, mas que a documentação falava o contrário. O policial iria falar:
 
— Olha, aqui diz que a senhora não tem braço, mas a senhora tem. Vou ter que prendê-la por ter um braço a mais.
 
O que ela poderia dizer a seu favor?
 
— Seu policial, o braço cresceu de novo.
 
— Olha, a senhora vai ter que ir para a delegacia para explicar esse braço a mais. Não sei se a senhora está fazendo tráfico de braços...
 
Voltando para a sala de espera, a minha última pergunta a mim mesmo foi: como ela permitiu e assinou uma documentação atestando que ela não tinha braço, no momento do exame inicial?
 
Bem, naquele momento em que estávamos confabulando sobre o que poderia acontecer futuramente com sua documentação, adentra o recinto uma senhora na faixa dos 50 anos de idade, com muita dificuldade para se locomover. Com o auxílio de uma bengala, demorou quase cinco minutos para chegar à sala e sentar-se adequadamente. Como de costume, perguntei por que ela estava ali. E novamente fui surpreendido. A reposta dela foi:
 
— Estou aqui para tirar carteira para usar a minha moto nova.
 
— O quê?! — exclamei.
 
— Comprei uma moto nova e preciso renovar a carteira — disse ela.
 
E eu disse:

— O quê?! Renovar?! A senhora já tinha carteira? — perguntei admirado.
 
— Sim, já tive duas motos anteriormente.
 
E eu perguntei:
 
— O quê?!
 
É por isso que gosto de conversar com todo tipo de pessoa. Você encontra várias surpresas na vida de cada uma. E, mesmo parecendo que a vida de um é parecida rotineiramente com a vida de outro, sempre existem curiosidades e peculiaridades que nos fazem refletir e crescer, de alguma forma. Aprendemos a rir juntos dos problemas e a entender que muita coisa pode ser superada sem nenhuma autopiedade. Por mais que no dia você esteja estressado, mal-humorado e sem vontade de cantar uma bela canção, não perca a oportunidade de conhecer novas pessoas.
 
E, ao conhecê-las, tente ouvir ao invés de falar. Lembre-se de que conhecer histórias de vida diferentes o ajudará a centralizar a sua. Não julgue, não condene, não dê sua opinião baseado nos seus valores ou experiências, não dê conselhos (pois eles são uma forma de nostalgia. É como pegar o seu passado em uma lata de lixo, limpá-lo e vendê-lo por um preço muito maior do que ele vale). Apenas ouça.

--
 
*Rui Miguel cresceu em Contagem. É formado em engenharia de rede de computadores e especialista Microsoft. Tímido e paradoxalmente extrovertido. Misterioso e intrigante, mas com um senso de humor incrivelmente inteligente e sarcástico. Em 2007, teve os primeiros sintomas do Parkinson e, depois de seis meses, o diagnóstico foi confirmado. É autor do livro “Entrando no parkinson de diversões” e, em 2017, foi nomeado comendador e profissional do ano com o blog que fala sobre “como viver a vida e não apenas sobreviver”. Também possui um canal no YouTube onde trata do mesmo assunto.
 
(O conteúdo dos artigos publicados pelo Diário de Contagem é de responsabilidade dos respectivos autores e não expressa a opinião do jornal.)
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