Data de publicação: 21-01-2020 18:08:00

Não seja tão supérfluo

Centro de Integração Empresa Escola de Minas Gerais -  CIEE
Foto: Internet/Reprodução
 
Rui Miguel*
 
“Quem tem dinheiro não é quem ganha muito, mas, sim, quem gasta pouco.”
Marco Aurélio
 
“Dessa vez eu não vou gastar um centavo”, pensei ao entrar em uma loja de presentes em Porto Seguro. Estava acompanhando Lilian e Janaina. Sim, amados, eu tenho um problema com gastar dinheiro com coisas supérfluas e com coisas que eu talvez nunca precise. Mas, naquele dia, eu estava decidido: não iria ceder aos meus desejos materialistas.
 
Não sei bem o significado dessa palavra. Seria materialista a pessoa que acumula bens materiais exageradamente ou a pessoa que compra qualquer coisa que deseja? Porque nessas duas situações o grande fator central são os bens materiais.
 
Bem, estávamos em Porto Seguro, passando por uma passarela que desemboca em uma das praias da região, na enseada de Coroa Vermelha, e adentramos – a pedido da minha esposa – em uma das dezenas de lojas de presentes que existem no local. Todas as lojas vendiam as mesmas mercadorias: lembranças praianas do local e também indígenas, cultura que é extremamente forte na região.
 
São lojas de presentes delicados e pequenos, nas quais duas pessoas quase não conseguem andar no mesmo corredor, em que você tem que seguir em fila indiana e onde todas as mercadorias ficam estritamente próximas, de modo que se você der um espirro vários objetos podem sair voando. Amados, afastem-se desses locais!
 
Mas, como eu queria ser um cara prestativo, e até explicar para as pessoas o porquê da minha negativa em entrar na loja – em palavras populares: até explicar que “focinho de porco não é tomada” –, resolvi entrar. Porém, com uma mentalidade certeira e assertiva: não vou comprar nada, não preciso de nada aqui.
 
Dei uma pequena risada sozinho, orgulhoso do meu autocontrole.
 
– Tudo supérfluo. Não preciso de nada e não gosto de levar presentes para uma pessoa apenas.
 
Enquanto estava perdido no meio dos meus pensamentos, avistei um barco à vela feito e entalhado manualmente, de muito bom gosto, que estava em uma prateleira, bem na última parte, quase encostando no teto.
 
Como tenho 1,80 metro, resolvi pegá-lo sem a ajuda do proprietário da loja. Quando coloquei minha mão no barco, que devia ter uns 50 centímetros de comprimento, notei, depois de já tê-lo removido do local, que ele segurava uma série de outros barcos, em sentido dominó. Ao me dar conta disso, o nervosismo apareceu, e, além de eu deixar cair o barco que estava em minhas mãos – e, lógico, danificá-lo – mais três barcos vieram em sequência. Consegui desvencilhar-me de dois, mas o terceiro me surpreendeu e caiu com a proa virada para a minha testa.
 
Apressado, arrumei tudo, pedi desculpas e, momentos depois de termos conversado sobre os prejuízos, saí da loja. Mas não antes de derrubar uma placa que tinha cerca de 60 brincos expostos.
 
Resumindo: no dia em que o sol estava reluzente, o céu azul anil, e eu disposto a não gastar nenhum centavo, saí da loja comprando três barcos feitos por índios que eu não queria, 20 brincos quebrados e um corte na testa que me custou três horas no hospital e quatro pontos na cabeça.
 
Fim do dia. E veio a noitinha, e veio a manhã.
 
Nosso grande problema é que ficamos tão focados no desejo de ter essas coisas que não aproveitamos o que já temos. É isso que temos que entender. Se sempre buscarmos satisfazer os nossos desejos, nunca ficaremos satisfeitos. A essência da felicidade independe das suas condições físicas ou financeiras. Você tem que aproveitar o momento. Em vez de perder todo o seu tempo com o que você deseja e não tem, aproveite o que você tem à sua volta: sua família, seus amigos, e tente viver sem desejar mais nada.
 
Eu sei que é difícil, porque vai contra a nossa tendência humana, mas você vai conseguir.
 
--
 
*Rui Miguel cresceu em Contagem. É formado em engenharia de rede de computadores e especialista Microsoft. Tímido e paradoxalmente extrovertido. Misterioso e intrigante, mas com um senso de humor incrivelmente inteligente e sarcástico. Em 2007, teve os primeiros sintomas do Parkinson e, depois de seis meses, o diagnóstico foi confirmado. É autor do livro “Entrando no parkinson de diversões” e, em 2017, foi nomeado comendador e profissional do ano com o blog que fala sobre “como viver a vida e não apenas sobreviver”. Também possui um canal no YouTube onde trata do mesmo assunto.
 
(O conteúdo dos artigos publicados pelo Diário de Contagem é de responsabilidade dos respectivos autores e não expressa a opinião do jornal.)
Comentários

Charge


Flagrante


Boca no Trombone


Guia Comercial


Enquetes


Previsão do Tempo


Siga-nos:

Endereço: Av. Cardeal Eugênio Pacelli, 1996, Cidade Industrial
Contagem / MG - CEP: 32210-003
Telefone: (31) 2559-3888
E-mail: redacao@diariodecontagem.com.br